Há quem acuse Cavaco Silva de não demitir o Governo por este ser da sua cor política. Sou insuspeito de simpatia pelo actual presidente, mas acho que neste aspecto concreto, tais críticas não têm fundamento. O que Cavaco Silva receia é ficar com a batata quente nas mãos. Se demitisse o Governo havia duas hipóteses académicas que se colocavam: ou o PSD e o CDS apresentavam um novo governo, com outro líder, ou avançaria uma solução de iniciativa presidencial. São, como disse, hipóteses meramente académicas que não têm qualquer hipótese de concretização prática. E, se por absurdo uma delas acontecesse, Cavaco Silva passaria, na prática, a ser o responsável nº1 por tal Governo e, obviamente, pelas políticas que viesse a desenvolver. Não é uma perspectiva que lhe agrade, imagino.
O que iria fatalmente acontecer era a realização de eleições antecipadas. E o que tira o sono a Cavaco Silva é saber o que resultaria daí. Olhando para as sondagens, o mais provável seria o PS vencer, sem maioria absoluta, e com menos votos e deputados do que PSD e CDS. Como não é expectável que o PCP e o Bloco larguem o bem-bom de fazer oposição a tudo o que mexe e avancem como suporte de um eventual Governo PS, teríamos uma crise política. E toda a gente acusaria Cavaco Silva de ser o seu responsável e exigiriam que arranjasse uma solução para o problema.
É este cenário que arrepia o actual presidente da República e o faz ficar quieto e calado, na esperança que ninguém se lembre que ele existe. Cavaco não quer proteger nem apoiar Passos Coelho ou o PSD. Se as sondagens dessem maioria absoluta ao PS, ele não hesitaria um segundo em mandar o Governo abaixo. Basta olhar para o seu percurso político para concluir que o homem de Boliqueime não está minimamente preocupado com Passos Coelho, com o PSD ou com quem quer que seja. Cavaco só se preocupa com Cavaco.
(Opinião, Jorge Eusébio)
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