sábado, 27 de julho de 2013

Os culpados são os gajos que compraram dois telemóveis

Os  fanáticos da austeridade dizem que ela é um mal necessário para reparar os exageros cometidos pelos portugueses em matéria de consumo, ao longo das últimas décadas. Um dos pecados maiores dessa gente foi terem ido pedir rios de dinheiro aos bancos para comprar casas, férias, televisores, telemóveis e outros bens e serviços absolutamente supérfluos. Estes malandros andaram anos e anos a fio a viver acima das suas possibilidades e devido a isso causaram o buraco que agora estamos a pagar.

Esta é uma tese que tem conseguido grande sucesso, apesar de não ser verdadeira. É óbvio que houve gente que andou a viver do crédito, mas não é por aí que chegámos à desgraça actual. Há dias, esteve em Santarém Paulo Morais, o vice-presidente da Associação Transparência e Integridade, que desmontou esta e outras histórias da carochinha.  A parte da dívida privada que é resultado deste tipo de empréstimos é de apenas 15%. Idêntica percentagem é a que tem a ver com o financiamento às empresas, enquanto que o grosso da dívida (e recordo que estamos a falar de dívida privada e não pública) tem a ver com empréstimos concedidos pela banca a especuladores amigos, sobretudo da área do imobiliário, sem exigir as necessárias garantias reais.

Quanto à dívida pública, ela resulta de muitos factores. Uma das facturas mais pesadas refere-se com as obras faraónicas decididas pelos políticos para darem muitos milhões a ganhar às empresas do regime. Empresas para onde, obviamente por coincidência, muitos deles acabaram por ir trabalhar depois de saírem do Governo. A cereja no topo do bolo foi a invenção das chamadas parcerias público-privadas, em que as perdas vão todas para o estado e os lucros para o bolso dos parceiros privados. Paulo Morais, cuja conferência se pode ver no site do jornal O Ribatejo, dá o exemplo de uma auto-estrada em que se os índices de sinistralidade aumentarem 10%, a empresa responsável pela sua manutenção tem de pagar 600 mil euros ao Estado. Mas se for ao contrário, ou seja, se a sinistralidade diminuir em idêntica proporção, o Estado é obrigado a dar-lhe um prémio de 30 e tal milhões de euros. É, como se vê, um contrato equilibrado e que defende o interesse público.

Outro dos grandes responsáveis pelo buraco das contas públicas é, como todos sabemos, o apoio dado aos bancos. Em especial, a decisão de nacionalizar o BPN, que nos custou cerca de 7 mil milhões. Coisa pouca e sem importância, tendo em conta que uma das pessoas que exerceu funções de importância na empresa proprietária do banco foi, nos últimos dias, elevado à categoria de ministro. E, portanto, voltámos ao início. Os culpados da crise são os gajos que compraram dois telemóveis em vez de um. O resto é conversa, são teorias da conspiração.
 
(Opinião, Jorge Eusébio)

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Incêndio no Vale de Santarém

82 homens de diversas corporações de bombeiros da região combateram esta tarde um incêndio florestal que deflagrou pouco antes das 15 horas no Vale de Santarém. Estes elementos foram apoiados por 18 viaturas terrestres e um helicóptero, informou o comandante dos Bombeiros Municipais de Santarém, Nuno Oliveira. Apesar de haver casas de habitação perto do incêndio, nenhuma foi atingida. Durante cerca de uma hora esteve interrompida a circulação ferroviária, devido às chamas e fumo intenso que se faziam sentir junto à linha.





Um concelho rico

Parece que Passos Coelho tem razão. Há indicadores positivos no que diz respeito à inversão da situação económica. Basta ver que os 500 mil festivais de Verão que por aí se realizam estão apinhados de gente para se concluir que a crise, com certeza, já está a ficar para trás. 

Portugal deve ser o país do mundo com mais festivais de música por metro quadrado, sobretudo nos meses de Julho e Agosto. E sempre a abarrotar de gente a abanar o capacete, o que é surpreendente. Definitivamente, não há crise para os promotores deste tipo de espectáculos que até contam com uma promoção brutal dos principais órgãos de comunicação nacional. Ainda no outro dia, ao fazer zapping, passei pela RTP 1 e lá estavam a transmitir um programa de total e descarada publicidade a um destes festivais. Ou seja, uma empresa pública a contribuir para o sucesso económico de uma empresa privada. E, provavelmente, à borla, pois a preços de tabela custaria seguramente uma fortuna o tempo que o programa durou e os meios que envolveu. Deve ser a isto que chamam serviço público. Assim já vale a pena que dos meus impostos saia uma verba jeitosa para manter a RTP a funcionar.

Outro sinal de que a muito bom português a crise não bate à porta é a quantidade de pessoas que já entopem as estradas e, sobretudo, as praias algarvias. Não que eu critique. Sou algarvio e, vivendo aquela região quase exclusivamente do turismo, quanto mais gente lá for, melhor. Só que me chateia ter a praia atafulhada da primeira vez que lá ponho os pés. E, ainda por cima, depois de ter esperado pelo fim da tarde, confiante de que, a essa hora, já a malta havia deixado ao areal.

Curiosamente, nesta altura, o Algarve não parece estar em vésperas de eleições locais, pois quase não coloquei a vista em cima de outdoors dos candidatos autárquicos. A não ser que tenha andado muito distraído, apenas me deparei com dois ou três cartazes pequenos do Bloco de Esquerda e da CDU. No total, parece-me que os quatro concelhos algarvios por onde passei, todos juntos devem ter menos cartazes políticos expostos do que o Cartaxo. Sinal, imagino, de que, por cá, a crise já passou. E que, ao contrário do que fazem questão de dizer algumas aves agoirentas, afinal, este é um concelho rico.  


(Opinião, Jorge Eusébio)

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Mais um prego no caixão


A Comissão Nacional de Eleições desferiu, recentemente, mais uma machadada nos órgãos de comunicação social, sobretudo, os locais. Mal foi marcada a data das autárquicas, fez questão de vir dizer que nem sonhem os jornais e as rádios em ganhar algum dinheiro com elas. 

Apesar da crise, as candidaturas ainda arranjaram, como sempre acontece, umas verbas razoáveis para gastar e algumas já tinham uma parcela destinada a promover os seus eventos e iniciativas mais importantes através de publicidade paga nas rádios e nos jornais locais e regionais. Uma situação que em nada punha em causa a cobertura jornalística que os diversos órgãos de comunicação entendessem fazer da actualidade política. 

Pois bem, como dizia, mal foi marcada a data, a Comissão Nacional de Eleições emitiu um comunicado a avisar que, segundo a legislação em vigor, a partir daquele momento isso deixava de ser possível. O argumento fantástico que utiliza é que, e cito, se pretende “impedir que através da compra de espaços ou serviços por parte das forças políticas se viesse a introduzir um factor de desigualdade entre elas, derivado das suas disponibilidades financeiras”. 

Aparentemente, não passa pela cabeça destes senhores, nem dos que aprovaram a lei, que esse factor de desigualdade se possa fazer sentir de outras formas. O dinheiro que os candidatos poupam desta forma, vão gastá-lo em mais outdoors, em jornais de campanha, em balões, porta-chaves, canetas e mais não sei o quê. Ou seja, as candidaturas que têm mais dinheiro continuarão a ter mil e uma formas a mais do que as que têm poucas verbas para se promover e chegar ao eleitorado.

Se estes senhores estivessem genuinamente preocupados em dar as mesmas condições  a todos, viriam defender que se legislasse no sentido de todas as candidaturas terem obrigatoriamente de fazer a campanha com o mesmo orçamento.

Assim, com esta decisão pateta, só se consegue pregar mais uns pregos no caixão de muitos jornais e rádios, que precisam de todas as pequenas verbas que seja possível obter para tentarem sobreviver mais uns meses ou um ano ou dois. 
Mas, pronto, parece que assim se salva a democracia e as eleições livres e justas. Dou graças a Deus por isso.
(Opinião, Jorge Eusébio)

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Deus não estava particularmente inspirado quando inventou os políticos

(Crónica de 5 de Julho para a Rádio Cartaxo)
À hora a que gravo esta crónica, leio que Paulo Portas deverá continuar no Governo. Mas é bem provável que na altura em que a ouvem tudo tenha mudado pela milésima vez e o homem se tenha mesmo pirado, de forma a conseguir fazer oposição ao Governo a tempo inteiro e não apenas em part-time, como tem acontecido até agora.
Tem sido assim ao longo de toda a semana. Portas diz que sai e os restantes elementos do seu partido vêm atrás. Uns minutos mais tarde, ele sai, mas os outros ficam. Depois, ele regressa e é promovido. Mais tarde surge a notícia de que afinal o CDS apoia até à morte o Governo, mas Paulo Portas põe-se a milhas e, até à altura que gravo esta crónica, o mais recente desenvolvimento em relação a esta novela rasca é que o sr. presidente da República acordou do seu sono profundo e faz muita questão em que o líder do CDS fique.

Ao longo das últimas décadas tivemos muitas cenas tristes envolvendo políticos ao mais alto nível, mas acho que esta entra para o topo da lista. Começou com um ministro das Finanças que já queria ir embora há 8 meses, pois percebeu no que a triste política que protagonizou ia dar. E, ao sair, deixou uma confissão de derrota. Provavelmente, Passos Coelho não leu a carta e convidou para substitui-lo a pessoa que dava mais garantias de seguir cegamente a política que o próprio Vítor Gaspar assumiu ter falhado. Isso foi suficiente para Paulo Portas se passar da cabeça e, sem avisar ninguém, demitir-se e provocar toda esta novela mexicana.

Portas e Passos parecem uns putos traquinas, a ver qual deles consegue tramar o outro. Mas isso ainda seria o menos. O pior é que continuam, como têm feito nos últimos dois anos, a tramar-nos a todos. Estava na altura de abalarem, mas parece que vão ficar. Não temos mesmo sorte nenhuma.
De alguma forma, estes tristes episódios vêm revelar em todo o seu esplendor o que é a nossa nobre actividade política. É uma arte recheada de golpes baixos, traições e amuos em que em primeiro e, praticamente único lugar, estão os interesses dos protagonistas políticos. A conversa sobre o bem e serviço público é mesmo só para iludir o Zé Povinho.

Nesta altura do campeonato é ainda mais complicado aturar políticos, sobretudo os que concorrem às autárquicas. Muitos deles parecem, tal como Portas e Passos, miúdos de 5 anos, que se acham o centro do mundo, fazem birra por tudo e por nada e precisam de manifestações de carinho e afecto a toda a hora. E quem não lhes dá a devida atenção e não lhes diz são os maiores do mundo é porque está feito com o adversário.
Decididamente, Deus não estava num dos seus melhores momentos quando inventou os políticos.

(Opinião, Jorge Eusébio)

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Programa de Governo

Podem continuar com jogos florais, a estrebuchar, a dar as voltas que queiram, mas a verdade é que este governo morreu e a situação só se resolve com novas eleições. Ao próximo executivo que daí resultar compete-lhe definir uma estratégia totalmente diferente desta e, sobretudo, convencer os nossos credores da necessidade de nos ajudarem a colocá-la em prática. Essa nova estratégia deverá passar, entre outras, pelas seguintes medidas:

1)      Renegociação global da dívida – É hoje claro para praticamente toda a gente que nas actuais condições não vamos ter possibilidade de continuar a pagar a dívida que temos por muito mais tempo. Já não há hipótese de aumentar ainda mais a rapina sobre os contribuintes e sem crescimento ou com crescimento económico anémico não é possível ao Estado obter recursos para continuar a pagar as dívidas. Torna-se, por isso, fundamental convencer os nossos credores e as instâncias internacionais da necessidade de reestruturar a dívida, a da troika e toda a outra. O ideal seria, conforme defende Miguel Cadilhe (li numa entrevista à Visão ou Sábado, mas não consigo encontrar o link), obter um novo empréstimo, a juros baixos, de forma a pagar os que temos a juros elevados (digamos, acima dos 4%). Isso faria com que se poupasse muito, mas mesmo muito dinheiro em juros. A tarefa principal do novo Governo será elaborar um plano nesse sentido, com cabeça, tronco e membros e, mais difícil ainda, convencer os nossos credores a assumi-lo. Não será fácil, mas não é impossível, pois burros é que eles não são. Entre receber em condições diferentes e não receber, de certeza que eles preferem a primeira hipótese. Mas para aumentar as possibilidades de sucesso, é fundamental envolver no projecto os outros países europeus mais afectados pela crise económica. Também se deve aumentar substancialmente o número de anos para atingir o mítico défice dos 3%. 

2)      Vender a dívida aos portugueses – Não há razão nenhuma para que o Estado não venda parte substancial da sua dívida aos cidadãos nacionais. A poupança dos particulares até tem vindo a aumentar e os portugueses, em vez de a estarem a aplicar em depósitos a prazo, que não rendem praticamente nada, ou em produtos mais ou menos tóxicos dos bancos, podiam utilizá-la para comprar dívida pública e assim conseguiríamos diminuir a nossa dependência dos especuladores internacionais. 

3)      Pôr a economia a mexer – Com a reestruturação da dívida, o Estado poupava muito dinheiro, podendo assim baixar impostos sobretudo às empresas, de forma a que elas possam iniciar um processo de investimento, modernização e criação de emprego, o que se vai reflectir em mais impostos cobrados pelo Estado e em menos despesa paga em subsídios de desemprego. É também importante que o próprio Estado pague o que deve às empresas, através do que sobrou do fundo de recapitalização da banca ou por outra qualquer forma. Complementarmente, ou em alternativa, há que pôr rapidamente em prática a proposta apresentada pelo PS e aprovada recentemente na Assembleia da República de que a Caixa Geral de Depósito pague essas verbas às empresas e depois faça contas com o seu accionista único, o Estado. 

4)      Rever o processo BPN – Há que voltar a reanalisar todo o processo de apoio à banca, em especial, o do BPN. É sabido que os seus anteriores donos – responsáveis por acção ou omissão de tudo o que se passou – continuam a ter vultuoso património e a viver à grande e à francesa. É mais do que justo que o Estado os obrigue a pagar parte do buraco. Não consigo perceber como é que isso não foi feito até agora. 

5)      Rever o processo das PPP – As chamadas parcerias público-privadas são um dos maiores fardos que temos de carregar ao longo de muitos e muitos anos se nada for feito. Mas não é necessário que assim seja. Segundo Paulo Morais, há várias alternativas: negociar a sério com as concessionárias, ir para tribunal ou nacionalizar as concessões, indemnizando os concessionários. Em qualquer das situações, garante, poupamos muito dinheiro. 

6)      Acabar com taxas e comissões abusivas – Fazer um estudo completo das taxas que a banca está a cobrar e acabar com as que sejam ilegais ou abusivas. O próprio Estado deve dar o exemplo e acabar com penalizações exorbitantes que aplica às pessoas ou empresas que não conseguem cumprir as suas obrigações no prazo legal. Por exemplo, quem não consegue pagar o IVA a tempo e horas leva com uma penalização em cima de 30%, o que é uma loucura. Haverá poucas formas mais eficazes de rebentar com as poucas empresas que ainda vão mexendo. 

7)      Mão firme na electricidade e combustíveisSegundo José Gomes Ferreira, estamos a pagar a electricidade e os combustíveis a preços bem mais elevados do que deveríamos. Há que acabar com isso. 

8)      Diminuir despesas do Estado – Deve-se fazer um estudo exaustivo sobre os gastos do Estado e definir e pôr em prática um plano que leva à sua efectiva redução. Acho, por exemplo, que há gente a mais na função pública, pelo que se deve baixar o número de funcionários, mas de forma faseada, num prazo de 4 ou 5 anos, pois mandar num único ano 50 mil pessoas para o desemprego cria mais problemas do que benefícios à economia e ao próprio Estado.

(Opinião, Jorge Eusébio)