terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Brincar com o fogo

Passos Coelho, Cavaco e a companhia -  que, se pudessem, anulavam as eleições gregas - andam por aí a tentar meter na cabeça das pessoas a ideia que o que Tsipras e Varoufakis querem é mais dinheiro e que para esse peditório Portugal já deu.

Posso ter andado distraído, mas parece-me que não é isso que está em causa. O que o novo governo grego quer é melhores condições para conseguir pagar e, ao mesmo tempo, para que os seus cidadãos possam ter um nível de via minimamente condigno.

Mesmo os mais fanáticos adeptos do status quo deviam achar que, ao fim destes anos todos, convinha fazer um balanço e perceber se o programa da austeridade resolveu os problemas que era suposto resolver. Não resolveu, como é fácil de constatar. Basta para isso recorrermos à análise de Vítor Bento, um homem até há bem pouco tempo acérrimo defensor da austeridade.

Portanto, se as coisas não estão a resultar, seria uma mera de questão de bom-senso mudar o rumo. Mas, afinal, parece que bom-senso é uma qualidade demasiado radical para quem manda nisto.

Mas há muito mais do que a dívida em jogo. É a própria Europa que está em jogo. Apesar de todos os problemas, este ainda é capaz de ser o cantinho do mundo melhor para se viver. De uma forma geral, os europeus têm tido paz e prosperidade ao longo das últimas sete décadas. Têm construído uma sociedade tolerante, aberta a outras culturas e religiões e solidária, em que todos têm direito a cuidados de saúde, a apoios sociais e a uma educação de qualidade.

Ora acontece que, em boa medida, a crise e a resposta da austeridade têm vindo a destruir esse modelo de vida europeu. Basta olhar à volta para ver que os níveis prestados pelos estados europeus (os dos países do Sul) aos níveis da Educação, Saúde e apoios sociais diminuíram substancialmente.
E mesmo a paz, que muitos pensam ser um dado adquirido pode estar em causa.

Voltando à questão grega. Imagine-se que não se chega a um acordo e se vê obrigada a sair do Euro. Volta ao dracma, uma moeda que se desvaloriza drasticamente. Fica, portanto, sem condições para pagar a dívida e com extrema dificuldade para comprar os bens e serviços de que precisa. Tem de arranjar outra forma de resolver minimamente esses problemas. E vai virar-se - como já é perfeitamente óbvio - para a Rússia que não brinca em serviço e não irá apoiar os grego pelos seus lindos olhos. Como o país não tem dinheiro, a compensação pode passar dar facilidades militares à Rússia no seu território.  Nas actuais circunstâncias, como uma guerra diplomática a travar-se entre a Rússia e os EUA e a Europa, imagine-se o que isso seria. 
A União Europeia está a brincar com o fogo por ter à sua frente um conjunto não de políticos ou estadistas, mas de maus 'contabilistas'.

(Opinião, Jorge Eusébio)

Sem comentários:

Enviar um comentário